EMBRIAGAR-SE… DE QUÊ?
Sabe aquele momento de exagero? Aquele em que você se excedeu muito, pulou de alegria, riu sem parar, cantou e deu saltos tentando se equilibrar no meio-fio da calçada? Aquele momento em que você se sentiu confiante, ou simplesmente se sentiu aliviado, baixou a pressão sobre seus ombros e se extasiou com certos fatos deixando os outros de lado. Pois é, amigo, você estava embriagado.
Mas não se iludam, embriagar-se não é apenas ingerir quantidades dantescas de bebida alcoólica como alguns podem ter pensado. Até o próprio dicionário é muito indelicado com a embriaguez, definida como: 1.Estado de quem se embrigou, bebedeira. 2.Arrombo, êxtase. Ora, convenhamos, embriagar-se não é apenas o famoso trago e, no caso do arrombo ou êxtase, nem todo mundo que se embriaga sofre desses aspectos.
Talvez o dicionário devesse ler a obra do grande escritor Baudelaire, que escreveu: “Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos; embriagai-vos sem tréguas! De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha!” Garanto que há muita gente que jamais colocou uma gota de álcool na boca e já se embriagou, seja de poesia, de virtude, ou qualquer outro sentimento.
Aliás, promulgo aqui uma verdade universal, sem medo generalizo e peço que me desmintam caso eu esteja errado: todo sentimento é capaz de embriagar, pois todo o sentimento é passível de exagero que é, em essência, a embriaguez. Posso muito bem encher-me de amor, por qualquer coisa, seja pelo meu time do coração, namorada, pela família ou por um simples objeto para os mais materialistas.
Posso embriagar-me também de tristezas, de sentimentos negativos, do medo de sair de casa, do luto, da perda de um objeto de valor. Posso me embriagar ao brigar com algum ente querido, ao guardar ressentimentos, enfim, poderia enumerar uma quantidade infinita de sentimentos intrínsecos e até mesmo não descobertos de cada ser humano que podem desencadear êxtase ou a antítese deste.
Claro que também é possível encher-se de elementos materiais. Há pessoas que se interessam em encher os bolsos de dinheiro ou meramente colecionar quantidades gigantescas de selos. Diversas pessoas só têm seus sentimentos despertados por aquisições, e por isso apenas conseguem se embriagar após ter sua ânsia de ter saturada. Não me cabe aqui julgar moralismos ou meios mais adequados de se extasiar, porém essa me parece a que mais desvaloriza a humanidade tão preservada para quem busca uma filosofia de embriaguez semelhante à de Baudelaire.
Enfim, se algumas vezes, “nos degraus de um palácio, na verde relva de um fosso, na desolada solidão do vosso quarto, despertardes, com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são; e o vento, e a vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder: é hora de se embriagar!”. Baudelaire já disse, e eu reafirmo aqui que podemos nos embriagar de tudo que é bom e, infelizmente, de tudo que é ruim. Independente do tipo ou estado da embriaguez, devo alertá-los para o que com certeza todo mundo sabe – depois de se embriagar sempre vem a ressaca! Mas falar da ressaca, aí já é assunto para outro texto de definição.